O assunto em
pauta tem sido um dos mais discutidos na atualidade, sobretudo quando ocorrem
crimes graves praticados por adolescentes, que se incluem na faixa etária de 12
a 17 anos.
No Brasil, as pesquisas mostram que a maioria das pessoas é
favorável à redução da maioridade penal, isto é, o criminoso, a partir dos 16
anos, já deveria estar sujeito ao Código Penal e cumprir pena privativa de
liberdade nas Unidades Prisionais.
O argumento mais utilizado para a
redução diz respeito ao fato de se poder votar a partir dos 16 anos, de forma
que, se o jovem tem maturidade para escolher os governantes, também tem noção do
certo e do errado e deve sofrer sanções mais graves quando comete delitos. Como
o artigo tem o escopo de analisar o tema sob o enfoque espírita, valeria a pena
perguntar: que a Espiritualidade superior diz a respeito do assunto?
No
livro Atualidade do pensamento espírita, 1 ditado pelo Espírito
Vianna de Carvalho, através da mediunidade de Divaldo PereiravFranco, há a
seguinte pergunta:
[...] A legislação penal aplicável às crianças e
adolescentes deve ser idêntica à estabelecida para adultos?
O citado
Espírito responde (trechos destacados pelo subscritor deste artigo): A
criança, que inspira ternura e amor, não obstante o período de infância que
atravessa, é um Espírito vivido e quiçá experiente que traz, das reencarnações
passadas, as conquistas e os prejuízos que foram acumulados através do tempo. No
entanto, a criança e o adolescente, quando delinquem, devem receber um
tratamento especial, porquanto o discernimento e a lucidez da razão ainda não
lhes facultam a capacidade de saber o que é certo e o que é errado, sendo
facilmente influenciados para esta ou aquela atitude.
Como consequência,
devem ser-lhes aplicadas legislações próprias, compatíveis com o seu nível de
crescimento intelectual e moral. A preocupação precípua, no entanto, deverá ser
sempre a de educar, oferecendo-se os recursos necessários para que sejam
evitados muitos dos delitos que ora ocorrem na sociedade ainda
injusta.
Quando, porém, acontecer-lhes o desequilíbrio, é necessário que
se tenha em mente sua reeducação, evitando-se piorar-lhes a situação, assim
transformando-os em criminosos inveterados, em razão da promiscuidade vigente
nos Institutos Penitenciários e nos Presídios comuns ora superlotados, e quase
ao abandono.
Que resposta notável e profunda! Certamente, reflete a visão
da Espiritualidade superior. Trabalho como magistrado há 15 anos, com
execução criminal (cumprimento das penas pelos criminosos com 18 anos ou mais),
bem como já trabalhei por mais de sete anos na Área de Infância e Juventude, de
tal sorte que compactuo com a visão ofertada pelo Espírito Vianna de
Carvalho.
Entendo que um dos pontos mais relevantes na resposta do aludido
Espírito diz respeito à capacidade de o jovem ser mais influenciável por outras
pessoas e pelo meio em que vive. Não podemos ignorar que o jovem ainda está na
fase de formação da personalidade, o que o predispõe, com mais intensidade, a
ser influenciado.
Quando o Espírito é evoluído e já traz, das vidas
passadas, conquistas morais positivas, certamente saberá dizer “não” às opções
equivocadas que a vida lhe apresente, todavia, como a maioria dos Espíritos
reencarnados na Terra ainda traz limites evolutivos e imperfeições morais,
muitos se deixam arrastar pelas más influências e não possuem resistência moral
para enfrentar dignamente as questões sociais negativas (desemprego, condições
sociais injustas, carência educacional, problemas na área da saúde pública
etc.).
Dessa forma, é muito grave e pernicioso inserir o jovem
delinquente nas Unidades Prisionais superlotadas e relegadas ao abandono, onde
ele será facilmente manipulado pelo crime organizado e por criminosos mais
perigosos, o que reduz drasticamente a sua possibilidade de
reeducação.
Aliás,muitos criminosos já estão captando a mão-de-obra juvenil
nas ruas, com a promessa de “dinheiro fácil”. Imaginemos o resultado negativo se
colocássemos os jovens, como “presas fáceis”, no interior de uma Unidade
Prisional.
Anote-se que não podemos esquecer que o foco principal da pena
ou da medida educativa (destinada aos jovens infratores) é a recuperação do
indivíduo para que ele possa voltar a viver em sociedade, sem se comprometer
novamente com as leis.
Quando se pensa apenas no aspecto “punição”, é
natural que a maioria deseje a redução da maioridade penal, porque a internação
pelo prazo máximo de três anos, conforme prevê o Estatuto da Criança e do
Adolescente, seria insuficiente para os atos infracionais graves (homicídio,
roubo, tráfico de drogas, estupro etc.).
Concordo com a alteração do
Estatuto da Criança e do Adolescente no que se refere ao aumento do tempo de
internação, a fim de que o jovem infrator com mais periculosidade possa receber,
por mais tempo, um tratamento especial e qualificado, visando sua reeducação e
reinserção social. No Estado de São Paulo, a atual Fundação Centro de
Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Fundação Casa), que substituiu a
Febem, tem prestado relevante serviço à recuperação dos jovens infratores, pois
não há superlotação e há profissionais habilitados (assistentes sociais,
psicólogos, enfermeiros, professores etc.) para lidar com o jovem,
enriquecendo-lhes a vida com valores positivos e éticos.
Para comprovar a
eficácia da necessidade de uma legislação especial aos jovens, constata-se que a
reincidência nas Unidades Prisionais é muito superior àquela encontrada na
Fundação Casa. Registre-se, também, que o endurecimento das penas não reduz
criminalidade, como se pode verificar nos países em que, tendo sido adotada a
pena de morte, não houve redução dos delitos.
Desejar a redução da
maioridade penal é demonstrar conhecimento parcial sobre o assunto.
Infelizmente, com frequência externamos nossas vontades, estimulados pela
comoção social, e muitas leis são aprovadas e alteradas sob esse grito,
revelando-se, oportunamente, ineficazes.
O verdadeiro homem de bem, tocado
pelo Evangelho de Jesus, sensibiliza-se com a situação e ora pelas vítimas dos
atos infracionais, mas também se preocupa com a recuperação do jovem infrator,
dando a sua contribuição pessoal. Como?
Fazendo visitas religiosas às
instituições que acolhem os jovens infratores e os criminosos, participando de
entidades que amparam os jovens abandonados ou expostos a situações de risco,
educando os próprios filhos nas bases do legítimo amor, dando-lhes um
direcionamento religioso e moral, entre outras iniciativas.
A sociedade,
ao postular a redução da maioridade penal, sob o argumento de que há impunidade
aos jovens infratores, quer transferir apenas ao Estado a responsabilidade, mas
se esquece de que também deve contribuir para a diminuição da criminalidade,
seja juvenil, seja de adultos, dando oportunidades de recuperação ao
delinquente, acolhendo-o oportunamente, ofertando-lhe emprego e condições de uma
vida minimamente digna, porque o verdadeiro ,que nos leva a fazer ao outro o que desejamos para nós
mesmos.
Não nos esqueçamos da exortação elevada do benfeitor espiritual
Vianna de Carvalho: “A preocupação precípua, no entanto, deverá ser sempre a de
educar”, de forma que há necessidade de se manter uma legislação especial aos
jovens.
1 FRANCO, Divaldo P. Atualidade do pensamento espírita. Pelo
Espírito Vianna de Carvalho. 2. ed. Salvador: Leal, 2000. cap. 3.0, Ciências
jurídicas à luz do Espiritismo, q. 74.
*Por Alessandro Viana Vieira de Paula, matéria de capa da Revista O Reformador, Edição de Setembro de 2013.