Sentimento de inadequação, encontra-se na base de quase todos os transtornos
emocionais neuróticos.
A igualdade e a semelhança.
Kardec(1) nos ensina que “Deus criou iguais todos os Espíritos e que todos tendem para um mesmo fim”. Ainda nos esclarece que “todos os homens estão submetidos às mesmas leis da Natureza e não concedeu a nenhum deles superioridade natural; todos, aos seus olhos, são iguais”.
Notemos que os homens são iguais (idênticos) em suas essências, mas
apenas semelhantes (parecidos) no mundo em que vivem, quando exteriorizam as
suas características, as suas aptidões, traduzidas por diferenças. Ser igual e
ser diferente parece um paradoxo, mas não é quando estudamos as leis
divinas.
Kardec(1) também nos esclarece que “os Espíritos foram criados iguais,
mas cada um vive mais ou menos tempo e, consequentemente, tem feito maior ou
menor soma de aquisições”. Eis as diferenças entre os Espíritos encarnados em
nosso mundo.
Com o nosso corpo físico também ocorre a mesma coisa. Dois
corpos são idênticos em suas formações e constituições físicas, porém cada corpo
em evolução apresenta as características específicas para cada etapa do seu
crescimento e desenvolvimento. São iguais na essência da matéria, mas, ao mesmo
tempo, diferentes no que exteriorizam. As diferenças frequentemente apontadas
entre os seres humanos são secundárias, como exemplos: a raça, a religião, os
costumes, a diversidade cultural, os bens materiais adquiridos, posição social;
enfim, as condições sociais e de desenvolvimento onde se encontram.
Através
destas diferenças – características físicas e aquisições espirituais – o homem
(corpo e Espírito) é único. Esta somatória evolutiva dá a cada um a
personalidade própria, única, individual, que o faz diverso de todos os outros.
Não existem dois homens iguais, são apenas semelhantes, mesmo nos casos de
gêmeos univitelinos (idênticos). Mas, os Espíritos, mesmo observadas as
diferenças evolutivas, são igualmente portadores das potencialidades e das
possibilidades para alcançarem o objetivo final traçado por Deus – a perfeição.
Complexo de inferioridade
Por complexo entendemos ser um grupo de
ideias e sentimentos conscientes intervinculados que exercem efeitos dinâmicos
sobre o comportamento. Na psicanálise de Freud, os complexos de castração e de
Édipo são os únicos encontrados; já os de superioridade e inferioridade foram
propostos por Adler(²) para descrever um grupo de ideias e sentimentos que surgem
como reação ao sentimento de inferioridade ou superioridade relacionado com o
organismo como um todo. Na atualidade, o termo inferioridade designa um
sentimento de inadequação, ficando mais apropriado para a sua compreensão.
A
inadequação ou falta de adaptação é a incapacidade que tem um indivíduo de agir
efetivamente sobre o meio ambiente. Nesta ação ocorre a falta de discriminação
entre o que vê exteriormente e a percepção real daquilo que viu. Essa visão
distorcida interfere no seu próprio EU e, consequentemente, no seu modo de
viver.
Adler(²) ainda disse que o sentimento de inferioridade, seja qual for a
sua origem, é um fenômeno natural, desde que não invada e dirija todo o
psiquismo de modo permanente, impedindo o seu portador de qualquer tentativa de
sucesso em novos empreendimentos e conquistas. Se isto acontecer, estamos diante
de um complexo de inferioridade. Encontra-se na base de quase todos os
transtornos emocionais neuróticos.
As respostas ao complexo de inferioridade
podem se dar de várias maneiras. Citamos duas: ou responde com um conjunto de
indecisões, hesitações, dúvidas, receios, medos intensos, isolamento social e
sintomas emocionais de toda espécie; ou utiliza um mecanismo de compensação e
passa a agir como se tivesse uma superioridade. Neste caso, as atitudes são
perigosas, pois se sente superior em suas capacidades em relação aos demais, se
envaidece, tem exigências exageradas para consigo e para com os outros, podendo
ainda ter conduta tirânica e humilhar as pessoas com quem convive. Torna-se
vaidoso, pedante, arrogante, egoísta e antipático.
De um ou de outro modo, a
inferioridade atuante é um desequilíbrio psíquico e se exterioriza através de
sintomas emocionais de leves a graves. Impossibilita o portador de uma vida
adequada, dando-lhe insegurança, ansiedade e, ao mesmo tempo, a consciência que
deve mudar o seu modo de agir. Por isto que muitos procuram ajuda de
profissionais especializados.
É comum no mundo moderno, fonte inesgotável de
estímulos materialistas, a competição e a comparação entre as pessoas e muitas
têm isto como roteiro no seu modo de viver, alimentando ainda mais o complexo
quando presente.
Por que a inferioridade?
O sentir-se inferior tem
raízes profundas no inconsciente, nos traumas ocorridos no passado do Espírito
que interferem na formação da personalidade atual e, em cada momento, com as
atitudes errôneas perante a vida, que acabam sustentando a inferioridade.
É
interessante notar que as inibições aparecem quando a pessoa tem a ideia que
existem pessoas muito diferentes de si, algumas melhores outras piores. Para as
piores é dado pouco valor, pois não a afetam tanto, embora muitas vezes podem
até estimular o orgulho e o egoísmo por se achar superior a elas. Em relação às
melhores é que a coisa se complica e pode se instalar o complexo de
inferioridade.
Chamamos a atenção quando dissemos que todos os homens são
iguais em suas essências, que as suas diferenças são adquiridas com a evolução e
que todos têm as mesmas possibilidades para seguir no caminho do bem – da
perfeição. Então: por que se sentir inferior? Lembremos que o complexo de
inferioridade comumente surge de atitudes equivocadas perante a vida, como: uma
imaginação fantasiosa do que realmente ela é, uma dificuldade de suportar e
enfrentar o insucesso, um receio frente às exigências da sociedade, um exagero
de exigências contra si próprio, sentimento de incapacidade que intimida quando
se compara com o outro, dúvida da sua potencialidade etc. Esses equívocos
provocam a baixa autoestima, núcleo de quase todos os transtornos
psicológicos.
Como enfrentar a inferioridade?
Toda mudança na
estrutura psíquica e comportamental não é nada fácil. Para se renovar é
necessário força de vontade, perseverança, fé, conhecimento e, em especial,
autoconhecimento, que podem quebrar o circuito de ideias fixas e levar o homem a
novas conquistas e à autoconfiança.
Nesta luta árdua, a percepção da vida deve ser clara. A vida não pode ser aquela imposta pelos padrões da sociedade que, muitas vezes, é inacessível e bloqueadora do verdadeiro modo de ser. A vida é simples, muito mais do que se imagina.
Nesta luta árdua, a percepção da vida deve ser clara. A vida não pode ser aquela imposta pelos padrões da sociedade que, muitas vezes, é inacessível e bloqueadora do verdadeiro modo de ser. A vida é simples, muito mais do que se imagina.
O complexo de inferioridade tem
estado presente em pessoas com reincidência de insucessos. Primeiramente, uma
análise criteriosa destes pode ser de grande valia. Nesta ação, a
responsabilidade e a participação nos insucessos devem ser revistas. Não se deve
recuar e sentir medo diante deles. Devem ser encarados como aprendizagem.
É
interessante lembrar que o complexo de inferioridade pode surgir das comparações
do indivíduo com um outro ou com um modelo perfeito idealizado – o superior.
Nesta comparação é esquecida a condição que o superior depende do inferior para
a sua evolução tanto espiritual quanto material. Muitas tarefas que o indivíduo
inferior sabe, o superior não sabe e necessita delas para evoluir; do mesmo modo
o inverso. Entendendo desta forma ocorre a consciência do próprio valor, mesmo
trazendo na mente que existem diferenças entre os seres e os seus valores e que
todos são importantes e iguais perante os olhos de Deus. Deste modo, clareia-se
a visão e a percepção do mundo.
A conscientização do limite próprio, a humildade para dar (ao inferior) e receber (do superior) são imprescindíveis na transformação íntima.
A conscientização do limite próprio, a humildade para dar (ao inferior) e receber (do superior) são imprescindíveis na transformação íntima.
Kardec1 nos orienta assim: “o homem que tem consciência
da sua inferioridade, haure consoladora esperança na doutrina da reencarnação.
Se crê na justiça de Deus, não pode contar que venha a achar-se em pé de
igualdade com os que mais fizeram do que ele. Reanima-lhe a coragem e a ideia de
que a inferioridade não o deserda do supremo bem e que, mediante novos esforços,
dado lhe será conquistá-lo”. Diante destes ensinamentos, por que e para que a
inferioridade?
Lembremos que só devemos nos julgar inferior a Deus e nos
submeter à sua vontade em todos os planos da existência.
1. KARDEC,
Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução G.Ribeiro. Brasília: FEB, 1985, questões
171, 803 e 804.
2. AKOUN, A. e cols. Psicologia Moderna. São Paulo / Lisboa,
Verbo, 1978. p. 82, 83 e 84.
*Por José Luiz Condotta em O Clarim.