domingo, 3 de novembro de 2019

Religiões interpretam a morte para compreender a vida

Diferentes culturas traduzem os momentos finais da vida como novos ciclos. As religiões amenizam o sofrimento ao defender o entendimento da morte como um percurso natural da existência

Em vida, pouco tempo é dispensado em pensamentos sobre a morte. A ideia assume um tom mórbido. A finitude acaba sendo esquecida e distanciada da realidade, quando, de fato, é parte obrigatória da própria existência humana.

No Dia de Finados, a sociedade é confrontada com essa percepção, seja no desejo de homenagear entes queridos que se foram ou ao observar a movimentação na cidade, que ganha um fluxo diferente dos demais com as muitas visitas aos cemitérios. A data é marcada no calendário católico, mas seu simbolismo também reverbera por outras religiões. Dentre tantas, sete têm em comum a ressignificação da morte, e oferecem amparo aos fiéis em momentos de luto.

Ao invés de um motivo para tristeza, a morte pode ser uma oportunidade de celebrar o que foi feito de bom durante a vida. Essa é a interpretação budista, conforme explica Gislene Macêdo, que atua como facilitadora no Centro de Estudos Budistas Bodisatva (Cebb), no bairro Meireles.

Falar sobre a morte, na perspectiva budista, significa abordar também a forma como se vive. Ao viver de um modo bom - ou seja, trazer benefícios aos seres e não causar sofrimento - o momento da morte é acompanhado da sensação de dever cumprido, permitindo que as pessoas "se desprendam do corpo de forma mais suave". Os praticantes do budismo acreditam na possibilidade de renascer.

Gislene Macêdo considera que a morte nos coloca diante da "impermanência". A facilitadora recomenda refletir enquanto há tempo. "Não pensamos que vamos morrer, a gente tende a ignorar esse fato. Vivemos como se não houvesse amanhã. Aprendendo a morrer, a gente aprende também a viver", explica.

Reencarnação

O aprendizado marcou o processo de identificação de Fernando Bezerra com o espiritismo. O vice-presidente do Instituto de Cultura Espírita do Ceará (ICE) cita a prática do bem, da caridade ao outro, e entender o próximo como irmão, independentemente do pensamento religioso, como os fatores que mais o atraíram durante o primeiro contato com a religião.

"Foi a doutrina espírita que me deu uma ideia muito mais abrangente das religiões que existem no nosso planeta, e entender cada uma delas como fase nossa de aprendizado", diz. No espiritismo, não há um culto à morte ou desapego à vida. O objetivo, segundo Fernando, é entender o que representa a vida física para o seu processo de evolução como espírito. "A morte, para o espírita, é uma transformação. Ele sai da vida física e vai para a vida espiritual. A separação daqueles que se amam, no mundo das formas, faz parte de um processo natural".

Embora a saudade atinja o espírita como a qualquer outra pessoa, por compreender a doutrina, o praticante não se desespera, nem se sente "injustiçado perante as leis divinas". Entende que a morte é uma passagem de grande importância para o desenvolvimento espiritual.